sábado, 24 de abril de 2010

É preciso olhar a vida com olhos de criança (Henri Matisse)

Criar é próprio do artista - onde não há criação,não existe arte. Mas seria um engano atribuir esse poder a um dom inato.
Em matéria de arte, o autêntico criador não é apenas um ser dotado, é um homem que soube ordenar em vista de seus fins todo um feixe de atividades, cujo resultado é a obra de arte.

É por isso que a criação, para o artista, começa pela visão. Ver já é uma operação criativa e que exige esforço. Tudo o que vemos na vida corrente sofre maior ou menor deformação gerada pelos hábitos adquiridos, e esse fato talvez seja mais sensível numa época como a nossa, em que o cinema, a publicidade e as grandes lojas nos impõem diariamente um fluxo de imagens prontas, que, em certa medida, são para a visão aquilo que o preconceito é para a inteligência.
O esforço necessário para se libertar delas exige uma espécie de coragem; e essa coragem é indispensável ao artista, que deve ver a vida toda como quando criança; e a perda dessa possibilidade lhe tira a oportunidade de se exprimir de maneira original, isto é, pessoal.

Para tomar um exemplo, creio que para um verdadeiro pintor não há nada mais difícil do que pintar um rosa, pois para isso ele precisa em primeiro lugar esquecer todas as rosas pintadas. Muitas vezes perguntei às pessoas que iam me visitar em Vence: "Viu os acantos no talude ao longo da estrada?". Ninguém tinha visto; todos reconheceriam uma folha de acanto num capitel corintio, mas ao natural a lembrança do capitel impedia a visão do acanto. Um primeiro passo para a criação é perceber cada coisa em sua verdade, e isso supõe um esforço contínuo.

Criar é exprimir o que temos dentro de nós. Todo esforço de criação autêntico é interior. Temos também de alimentar nosso sentimento, o que se faz com o auxílio dos elementos que tiramos do mundo exterior. Aqui intervém o trabalho, por meio do qual o artista incorpora, assimila gradualmente o mundo exterior até que o tema que está desenhando se torne como uma parte de si mesmo, até que ele tenha o tema dentro de si e possa projeta-lo sobre a tela como sua própria criação.

2 comentários:

  1. Esse texto é maravilhoso e sintetiza uma concepção de arte e de processo de criação que muito me tem auxiliado no trabalho de arte no Estudo do Meio. Cada linha do texto tem um ensinamento, e eu gosto quando ele fala do poder de síntese da arte que tem a haver com interdisciplinaridade.

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  2. Realmente, Acácio, muito sucinto, no entanto bem entendível para trabalhar com alunos de Ensino Fundamental, e daí seguir com pesquisas e aprofundamento.

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